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O que significa ser pedagogo num lugar situado na periferia do mundo, num Estado chamado Tocantins?

* John David Ribeiro Santos

Para mim, ser pedagogo na periferia do mundo é compromisso sério, é agir modificando-se inteiro, modificando o ato em si e, modificando o resultado do ato.

O que significa ser pedagogo num lugar situado na periferia do mundo, num Estado chamado Tocantins? Num lugar onde a rejeição pela profissão docente torna- se cada vez mais nítida; onde a valorização do trabalho docente é o principal mote de promessas e discursos proferidos por políticos; onde quanto mais se fala em valorização dos educadores, menos se faz por eles; onde a maioria dos docentes, tem o direito de não ter direito? Aqui é um Estado formado por extensos latifúndios, controlado por uma pequena oligarquia rural, lugar de homens sem terra e terra sem homens.

Ser bom no trabalho de pedagogo é o mínino que devemos ser para mudar a vida de alguém e, por que não, mudar o mundo? Os pedagogos deveriam ser os primeiros a se alimentar de utopias; deveriam ser os primeiros a espernear para transformar a utopia em realidade. Recordo-me, aqui, de Paulo Freire em seu livro Pedagogia do Oprimido: “[...] os dominadores mantém o monopólio da palavra, com que mistificam, massificam e dominam. Nessa situação, os dominados, para dizerem a sua palavra, têm que lutar para tomá-la”.

Para mim, ser pedagogo na periferia do mundo é compromisso sério, é agir modificando-se inteiro, modificando o ato em si e, modificando o resultado do ato. É ter que formar mentes; é ter que tomar a “palavra” para poder dizer. E dizer, principalmente, para os que a desconhecem, citando de novo o educador brasileiro, que “[...] aprender a tomá-la dos que a detém e a recusam aos demais é difícil, mas imprescindível aprendizado – é a ‘pedagogia do oprimido’”.

O contexto social é marcado por um viés capitalista e sabemos que ele não é absoluto, mas é determinante. Por isso, pensa-se a partir das condições dadas por esse modo de produção, que divide a sociedade em duas classes antagônicas: opressores e oprimidos. Esse tem sido o real espectro que há séculos temos pensado, na busca por uma sociedade sem classes, igualitária e justa. Há muitos anos evoca-se sempre a Educação como fator de redenção dos males e explorações, como se ela fosse Cristo, o próprio Jesus, para transformar o mundo. Só que Educação diferentemente de Jesus não transforma o mundo. Como diria Paulo Freire: “Educação não transforma o mundo, educação muda pessoas, pessoas transformam o mundo”.

Aqui, no sertão, de quatro em quatro anos, ouve-se sempre discursos de diversos seguimentos sociais, principalmente de políticos, que a educação sozinha resolverá os problemas sociais ocasionados pelas desigualdades. A educação tem um objetivo mais profundo: a formação de seres humanos, de sujeitos, por meio de complexas relações sociopolíticas, culturais e educativas, tendo em vista a emancipação humana.

Assim, esses discursos proferidos, principalmente, por políticos e empresários visam glorificar a educação voltando-se apenas pelo que ela produz de útil aos seus próprios interesses e, “a inspiração que os move é material, financeira, pragmática” conforme os professores Ildeu Coêlho e Neidson Rodrigues. É bom lembrar que: “Os governos passam, mas a sociedade permanece e, a sociedade somos todos, incluídos os políticos, embora às vezes eles se esqueçam disso e creiam viver em outra galáxia, pulsando com um coração privilegiado, diferente do das pessoas.
A sociedade existiria sem governo, ao passo que os políticos, sem a sociedade e seu apoio, seriam juncos soprados pelo vento” destaca Juan Arias, no jornal El País.

Nós, pedagogos, sabemos que a educação como prática social e cultural atua como elemento determinado pela sociedade, pois ela age na conformação de um projeto social que tanto pode servir à manutenção dos privilégios de grupos que se encontram no poder econômico e político, como pode contribuir para subverter a lógica de dominação e exploração humana, por meio de uma ação transformadora de nossas práticas sociais. Educação é um ato político, “e um ato político significa, no quadro social, dizer que a educação não está divorciada das características da sociedade: ao contrário, ela é determinada pelas características básicas da sociedade na qual está inserida. E, quando a sociedade é dividida em classes cujos interesses são antagônicos, a educação serve a interesses de uma ou de outra das classes fundamentais” enfatiza o professor Dermeval Saviani.

Volto então à pergunta inicial: O que significa ser pedagogo num lugar situado na periferia do mundo, num Estado chamado Tocantins? Ser pedagogo na periferia do mundo, num lugar chamado Estado do Tocantins, é entender que precisamos tomar uma decisão: estar do lado dos ditadores de regras, criadores de slogans, dos proprietários de homens e de terras; ou do lado dos esfarrapados do mundo, esmagados pela sociedade, pisados pelos próprios homens, despossuídos de si mesmos e da terra. E não há possibilidade de uma terceira posição. Não se pode ser neutro. A neutralidade é impossível.

* Discurso do Orador ( John David Ribeiro Santos) da Turma de Pedagogia: Gilmar
da Silva Nascimento, formado pela UFT em abril de 2014


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